“Onde”
Muitos Cristãos pensam
que quando o Senhor disse “onde” Ele estaria querendo dizer “onde quer
que”. Eles têm a ideia de que o Senhor estava dizendo que um grupo de crentes
poderia se reunir da maneira que achasse melhor, quando e onde bem entendessem,
e com isso desfrutariam automaticamente da garantia da promessa feita pelo
Senhor a eles. Eles imaginam que se alguns Cristãos saírem para tomar um café
ou praticar um esporte juntos, eles podem reivindicar a promessa deste
versículo, de que o Senhor estaria no meio deles. Isso nada mais é do que tirar
esta preciosa passagem da Escritura completamente fora de seu contexto. É bem
verdade que o Senhor está com todos os crentes, individualmente, o tempo todo,
não importa onde eles possam estar (Mt 28:20; Hb 13:5), mas não é este o
contexto do versículo 20 de Mateus 18. Conforme já foi mencionado, este
versículo tem a ver com o Senhor estando no meio de uma assembleia divinamente
reunida para sancionar as ações administrativas dessa assembleia. Podemos
chamar isso de Sua presença coletivamente; enquanto as outras seriam a
Sua presença individualmente. As duas não devem ser confundidas. Existe
uma diferença entre Ele estar com os Cristãos, e os Cristãos terem a Ele no
meio de suas reuniões da assembleia.[1] A
presença do Senhor neste sentido coletivo é o que sanciona a existência daquele
grupo de pessoas que Ele reuniu pelo Espírito. Isto não se aplicaria a quaisquer
grupos de Cristãos formados por homens, pois se o Senhor concedesse Sua
presença, nesse sentido coletivo, a todos esses grupos, Ele estaria sancionando
as divisões no testemunho público da Igreja, as quais são uma desonra para
Deus. Cremos que Ele não faria isso.
Nem devemos confundir a
presença de Cristo e a presença do Espírito Santo. A presença do Espírito de
Deus é também conhecida de duas maneiras. Ele está tanto “nos” crentes (“em vós”) como “com”
os crentes (“convosco”) (Jo 14:17;
At 2:1-4). Primeiro, Ele habita em cada crente (Jo 14:17; Rm 8:9, 11; Ef
1:13, 4:30; 1 Ts 4:8; Tg 4:5; 1 Jo 3:24, 4:13). Em segundo, Ele habita
na casa de Deus onde existem tanto crentes como incrédulos (Jo 14:17; At 2:2;
Ef 2:22). Se um incrédulo se juntar aos crentes onde o Espírito Santo habita,
esse incrédulo poderá “participar” do Espírito de Deus mesmo estando em
sua condição de perdido. Essa participação, no sentido de provar dos
privilégios que os crentes desfrutam (Hb 6:4-5), seria evidentemente apenas
exterior, e não o desfrutar completo da comunhão que é privilégio apenas do
crente. Isto é indicado pelo uso da palavra “metecho” em grego, que
implica participação, sem, contudo, especificar o grau dessa participação.
Significa que até mesmo um incrédulo pode desfrutar dos privilégios exteriores
do Cristianismo, se estiver na casa de Deus onde o Espírito de Deus está
agindo.
Citamos aqui uma
passagem do livro “Help & Food” (“Auxílio e Alimento”) que fala da presença
do Espírito em toda parte na casa. “Estar reunido ao Seu Nome significa
que o Seu Nome constitui o Centro de união. O que nos une é a verdade de Quem Ele
é. Onde Ele encontrar um povo para o qual essa ligação é suficiente, ali Ele
promete a bênção de Sua presença pessoal no meio deles. Tal presença deve ser
distinguida da presença do Espírito Santo nos santos ou na assembleia como a
casa de Deus em geral. O Espírito Santo está sempre nos santos e na assembleia
de Deus como um todo, independentemente dos princípios sobre os quais estejam
reunidos, e a Sua presença, portanto, não sanciona a reunião tal como ela é.
Isso deve ser tão claro quanto importante, pois mostra como Deus pode operar em
Sua graça em meio a toda a confusão da Cristandade, sem necessariamente
sancionar, no mínimo, os princípios discordantes e sectários que prevalecem. A
presença de Cristo no meio, por outro lado, é uma sanção (não do estado da
assembleia, é claro), caso contrário o ‘tudo o que ligardes na Terra será
ligado no céu’ está conectado a ele.”[2]
O “onde” do
versículo (20), indica que o Senhor tem um lugar onde Ele colocou o Seu Nome na
Terra e Ele está ali no meio daqueles que Ele reuniu pelo Espírito em torno de
Si. É este o terreno dos princípios do Novo Testamento sobre o qual os Cristãos
são congregados para exercitarem ações administrativas (que é o contexto da
passagem), e inclui a adoração coletiva, o ministério e a oração. Os irmãos têm
chamado a isso de o divino terreno de reunião.
“Onde quer que seja”,
torna o local como sendo uma escolha nossa (como os homens dizem: “Vá
à igreja de sua escolha”); “onde”, por outro lado, torna o local
como Sua escolha – o local de Sua designação. O lugar não é um centro
geográfico, como era Jerusalém no judaísmo, mas um terreno espiritual de
princípios sobre os quais os Cristãos são congregados pelo Espírito. Os Cristãos
assim congregados podem estar congregados em diferentes lugares do mundo, porém
ocupam um terreno singular e estão em comunhão uns com os outros. Os vários
grupos podem estar congregados localmente em uma simples sala, em uma cozinha
ou barracão – o que importa é onde o Espírito de Deus os reuniu ao Nome do
Senhor Jesus Cristo.
Aprendemos de Hebreus
13:13 que este lugar onde o Senhor está no meio está “fora do arraial”,
uma expressão que significa o judaísmo com todos os seus princípios e práticas.
Os Cristãos costumam perder de vista este ponto, trazendo para seus lugares de
adoração muitas coisas conectadas à adoração judaica. Eles ignoram o claro
ensino da Escritura que dizem que o tabernáculo é uma figura do verdadeiro
santuário ao qual agora temos acesso pelo Espírito (Hb 9:8-9, 23-24). Em vez
disso, acabaram usando o tabernáculo como um modelo para suas
organizações eclesiásticas e sua adoração. Construíram grandes catedrais e templos
“feitos por mãos de homens” e literalmente emprestaram muitas coisas do Velho
Testamento para sua adoração. Perderam de vista o fato de que o verdadeiro
terreno Cristão de reunião e adoração é algo novo e completamente diferente e
com uma nova ordem de achegar-se a Deus “em espírito e em verdade” (Jo
4:23-24; Hb 10:19-20). Portanto, sabemos que este terreno de reunião para Cristãos
é totalmente livre de judaísmo e fora dele. Qualquer um que procurasse
encontrar este lugar da escolha do Senhor teria de virar as costas para todos
os lugares existentes na Cristandade, independentemente de ser a Catedral de
São Pedro em Roma ou uma simples capela evangélica, já que em todos os casos
existem os aparatos do judaísmo mesclados com os seus assim chamados cultos de
adoração Cristã.
O princípio de reunião
no Cristianismo é, como um todo, completamente diferente do judaísmo. O Senhor
revela o contraste entre eles em João 10, ao se referir ao terreno judaico de
reunião como “aprisco” e ao terreno Cristão de reunião como “rebanho”
(Jo 10:16). O aprisco, que é um lugar fechado (ou curral), indica a maneira
legalista usada pela lei para manter as ovelhas reunidas. As forças ou comandos
externos da lei, que necessariamente os separavam das nações, mantinham os
israelitas unidos. Por outro lado, um rebanho é uma reunião de ovelhas sem uma
cerca. As ovelhas estão reunidas, não por uma influência externa, mas por ter
ocorrido nelas um trabalho que faz com que sejam atraídas ao Pastor em seu
meio. Não há necessidade de cerca para mantê-las unidas; elas querem estar ali
por terem um mesmo polo de atração: o Pastor. F. C. Blount comparou o primeiro
caso a uma circunferência sem um centro, e o segundo um centro sem
circunferência. A fim de indicar a transição do judaísmo para o Cristianismo o
Senhor falou de levar Suas ovelhas para fora do “aprisco”, guiando-as na
forma de um “rebanho”.
[1] N.
do A.: “Can Christians be Gathered in Only One Place?” – Notes of General Meetings in Ottawa – 1987 – pág.
9.
[2] N. do A.: “The
True Church” – citações de vários
autores – compilado por M. W. Smith, pág. 12).
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